Manhã do dia 2 de janeiro. O Metrô, meio que vazio, parou no túnel algumas vezes. O operador do carro anunciou algo. Não me lembro bem das palavras exatas, mas informava que a razão da lentidão era uma obstrução de usuário. Após ter anunciado três vezes, na última avisou que o usuário já havia sido retirado do local.
Calafrio, isso significava o que eu esperava que não fosse.
Suspeita confirmada. Quando desci no Paraíso para fazer conexão com a linha verde do Metrô, percebi três funcionários em outra plataforma, com luvas cirúrgicas.
Ela já havia sido retirada, mas alguns objetos permaneciam. Me aproximei dos funcionários e, calada, apenas observei o trabalho rápido dos homens. Dentro do vão onde passa o carro, um trilho estava manchado de sangue e abaixo do outro havia uma possa. Um dos funcionários desceu o vão por uma escada de metal, se agachou, se reergueu e depositou um pedaço de pulseira de relógio sobre a plataforma. Na segunda levantada, um sapato feminino sem salto, surrado. E por último, um tufo de cabelo com pedaço do couro cabeludo. Entregou ao colega da plataforma, que embrulhou num saco plástico. Já dava para identificar algumas características: mulher, morena, pobre, solitária, desesperançada
A caminho da segunda linha, dois outros funcionários comentavam pesadamente o acontecido. Perguntei a um deles se foi grave. Respondeu que “não, ela caiu no vão, no meio do trilho, onde existe um buraco. Deve se salvar”.
Duvido. Eles são orientados a não revelar o acontecido. Um conhecido que também trabalha como operador confidenciou que vez ou outra o Metrô é lugar escolhido para praticar suicídio. Tudo é acobertado e a imprensa não divulga. Fala-se de suicídio na Suíça, na Espanha, mas, aqui, debaixo deste sol tropical paulista, estatisticamente não existe.
Essa mulher decidiu se suicidar um dia após à festa de Ano Novo, dia em que se fazem planos para o futuro, dia de reencontrar os antigos amigos, renovar os laços de amizade, ou comemorar em família se divertindo. Nessas épocas a mídia impiedosamente insiste em mostrar cenas de pessoas felizes, comemorando a passagem de ano, explosões de fogos de artifício que prenuncia o novo ano e a renovação de esperanças. Toda cena de felicidade da qual a mulher suicida certamente não dispunha.
A igreja dá seu pitaco quanto à ideia de autoflagelação definitiva. É contra. “Somente Deus pode tirar a vida”. E quem disse que esse comportamento não possa ser desígnio de Deus? Não julgo, entendo, entristeço em concluir que para alguns é a solução derradeira contra os problemas de uma alma destruída pela solidão ou pelas dificuldades que impõe a vida. A única forma de eliminar uma dor corrente, que vem das profundezas da alma, uma solução definitiva para quem não tem outra saída e não tem com quem contar.
Calafrio, isso significava o que eu esperava que não fosse.
Suspeita confirmada. Quando desci no Paraíso para fazer conexão com a linha verde do Metrô, percebi três funcionários em outra plataforma, com luvas cirúrgicas.
Ela já havia sido retirada, mas alguns objetos permaneciam. Me aproximei dos funcionários e, calada, apenas observei o trabalho rápido dos homens. Dentro do vão onde passa o carro, um trilho estava manchado de sangue e abaixo do outro havia uma possa. Um dos funcionários desceu o vão por uma escada de metal, se agachou, se reergueu e depositou um pedaço de pulseira de relógio sobre a plataforma. Na segunda levantada, um sapato feminino sem salto, surrado. E por último, um tufo de cabelo com pedaço do couro cabeludo. Entregou ao colega da plataforma, que embrulhou num saco plástico. Já dava para identificar algumas características: mulher, morena, pobre, solitária, desesperançada
A caminho da segunda linha, dois outros funcionários comentavam pesadamente o acontecido. Perguntei a um deles se foi grave. Respondeu que “não, ela caiu no vão, no meio do trilho, onde existe um buraco. Deve se salvar”.
Duvido. Eles são orientados a não revelar o acontecido. Um conhecido que também trabalha como operador confidenciou que vez ou outra o Metrô é lugar escolhido para praticar suicídio. Tudo é acobertado e a imprensa não divulga. Fala-se de suicídio na Suíça, na Espanha, mas, aqui, debaixo deste sol tropical paulista, estatisticamente não existe.
Essa mulher decidiu se suicidar um dia após à festa de Ano Novo, dia em que se fazem planos para o futuro, dia de reencontrar os antigos amigos, renovar os laços de amizade, ou comemorar em família se divertindo. Nessas épocas a mídia impiedosamente insiste em mostrar cenas de pessoas felizes, comemorando a passagem de ano, explosões de fogos de artifício que prenuncia o novo ano e a renovação de esperanças. Toda cena de felicidade da qual a mulher suicida certamente não dispunha.
A igreja dá seu pitaco quanto à ideia de autoflagelação definitiva. É contra. “Somente Deus pode tirar a vida”. E quem disse que esse comportamento não possa ser desígnio de Deus? Não julgo, entendo, entristeço em concluir que para alguns é a solução derradeira contra os problemas de uma alma destruída pela solidão ou pelas dificuldades que impõe a vida. A única forma de eliminar uma dor corrente, que vem das profundezas da alma, uma solução definitiva para quem não tem outra saída e não tem com quem contar.
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